Pra ajudar ao debate sobre a indisciplina nas escolas, deixei este comentário no Arrastão. É a velha questão - estamos a olhar a árvore de tão perto que não conseguimos ver a floresta.

"Sinceramente, está-se a fazer um barulho incomensuravelmente maior do que este incidente merece. O tratamento dado ao problema faz parecer que a indisciplina é o maior dos problemas que a escola enfrenta em Portugal. Não é, nem de longe. Antes pelo contrário, a cena que teve estes protagonistas, elevados a heróis pop, como diz o Daniel, não é sequer frequente, muito menos comum, na imensa maioria das nossas escolas. E nos sítios onde for, não é esta retórica vazia, mas planos concretos de acção que podem minorar o problema. Este show-off do Procurador Geral da República, agora ajudado pelo Presidente, vai no sentido contrário. Não é necessário nem sequer eficiente atacar este problema com generalidades ou medidas avulsas – porque cada caso é um caso e cada escola tem o meio-ambiente, diverso e complexo, que não se transforma por decreto nem só com palavreado.
Falando deste caso concreto, deixem-me também picar um bocado – há por todo o lado muita intolerância. A miúda teve uma atitude reprovável (e que mereceu justa punição), mas nada do outro mundo. Todos os incidentes que acontecem dentro de um grupo socialmente estável, como uma turma, têm um contexto. No caso, um contexto psicológico, social, familiar e escolar. Estarmos aqui a ditar sentenças para os alunos do 9ºC sem conhecer este contexto é irrelevante, e até, se me permitem, um pouco leviano. A escola tratou e resolveu o caso, a meu ver, muito bem. Deu-lhe a importância devida, aplicou as medidas necessárias tanto para punir como para reintegrar os alunos que estiveram em falta. E esta parte – a reintegração – é sumamente importante, porque é de adolescentes que estamos a falar. Infelizmente, este pequeno mas fulcral aspecto tem sido deixado de lado.
E, já agora, a tentativa um bocado mal-amanhada de ligar este episódio ao Estatuto do Aluno só pode ter duas fontes. A primeira, oportunismo político; a segunda, falta de sentido de realidade. O Estatuto merece muito mais debate do que o Ministério da Educação lhe dedicou, mas sejamos sérios – não há pontos de contacto entre as atitudes irreflectidas de um grupo de alunos e a legislação emergente."

10 Comentários a “Mais uma acha”

  1. # Blogger Leandro Covas

    Este comentário foi removido pelo autor.  

  2. # Blogger Leandro Covas

    Com o devido respeito Alexandre, mas é por causa de liberalismos sociais de pacotilha e de fugas irracionais à autoridade como a que demonstraste aqui que a falta de respeito e de autoridade nas escolas se tem agravado ao longo dos anos. As criancinhas são todas umas coitadinhas e nenhuma delas é responsável pelos seus comportamentos . Tão pouco os pais serão responsáveis. E, não fosse o vídeo, estes adolescentes nem sequer seriam punidos porque todos (escola e professora) abafariam o incidente (embora por razões diferentes).
    Estaríamos todos, em santa ignorância, a encolher os ombros a factos que constituem crimes.
    Um facto que é objectivamente um ilícito penal típico ficaria sem reacção porque "não é nada demais".
    Reabilitação para as crianças coitadinhas, "sumamente". E onde fica a prevenção geral contra estes comportamentos? Achas que é com a mudança de escola que se consegue a "manutenção contra fáctica da confiança e expectativa da comunidade jurídica na validade da norma infringida"?
    É a novíssima ideia de superação do conceito da culpa em todo o seu esplendor e potencial de dano social. Eu daqui infiro perigo.  

  3. # Anonymous Anónimo

    Fosga-se, dificilmente poderia estar mais em desacordo. Não tenho tempo para escrever, mas na minha opinião a indisciplina é de longe o problema mais grave do ensino básico (repito, básico). E fico muito contente que tenha surgido este vídeo, para as pessoas poderem ficar um bocado alertadas. Que venha todo o escândalo e toda a berraria do mundo.  

  4. # Blogger Alex

    Eh lá, vocês estão mesmo chateados!
    Leandro, dizes que "a falta de respeito e de autoridade nas escolas se tem agravado ao longo dos anos". Baseias esta afirmação em algum estudo ou é um impressão ou palpite teu? Tal como o PGR na semana passada, as nossas sensações podem não corresponder à realidade, ou pelo menos à realidade da generalidade dos estabelecimentos de ensino portugueses. Eu também não conheço nenhum estudo sobre o tema, mas se tivesse de palpitar, palpitaria contra esta afirmação. Depois, escreves que eu penso ou assumo que "As criancinhas são todas umas coitadinhas e nenhuma delas é responsável pelos seus comportamentos . Tão pouco os pais serão responsáveis.". Não sei como é que inferiste isto das minhas opiniões sobre o assunto.
    E quanto ao crime, neste caso concreto, não sei bem a que te referes. O único ilícito que reconheço é o da divulgação do vídeo sem conhecimento ou permissão das pessoas que nele estão. Quanto ao resto, não vejo crime algum. Estarei errado?
    Para completar o teu raciocínio, se a mudança de escola não é uma pena adequada, então diz-me o que é que seria adequado ao caso.
    Mário, realmente pode ser uma questão de opinião. Eu estou convencido que a indisciplina é um problema grave apenas em algumas escolas do país. Existem várias outas questões transversais a todo o ensino básico que me preocupam muito mais. Por exemplo:
    - o excesso de disciplinas e carga lectiva dos alunos do 2º e 3º ciclos, que impedem a execução de planos de apoio individualizados e participados para os alunos com mais dificuldades;
    - a descoordenação entre os programas das diferentes disciplinas e mesmo entre os programas da mesma disciplina em anos diferentes, o que leva a ser muito difícil promover a interdisciplinariedade e uma aprendizagem integrada e significativa;
    - a desarticulação entre os diferentes ciclos do ensino, o que leva a que dificuldades identificadas num ciclo não sejam eficazmente comunicadas e que todo o trabalho de apoio educativo realizado com um aluno se perca quando os miúdos mudam do 1º para o 2º ciclo e do básico para o secundário;
    - a falta de alternativas credíveis dentro da escola para os alunos que não conseguem ou não querem seguir a via "normal" da escolaridade até ao 9º ano;
    e poderia ir por aí fora. Isto é muito técnico? Deve ser. Mas na minha escola gastamos pouco tempo a falar de indisciplina (que é marginal), mas estivemos hoje 3 horas a discutir como é que vamos combater o insucesso no 10º ano, em que temos turmas com 70% de negativas a Matemática e 50% a Física e Química.  

  5. # Blogger Leandro Covas

    Alex,

    Crime: ofensas à integridade física.
    Eu não dou palpites. Quem quiser apostar que o faça. Eu conheci estas situações enquanto estudante e felizmente tenho televisão para ver as reportagens jornalísticas. Queres ver que queres mais estudos para constatar o óbvio?! Que existe violência endémica nas escolas e que se está a espalhar. Duas grandes e sonoras gargalhadas.  

  6. # Blogger Leandro Covas

    Quanto à pena: há que distinguir a responsabilidade disciplinar da responsabilidade legal. Neste caso, a aplicação da Lei Tutelar Educativa. E daí o sentido da intervenção do Procurador Geral da República e do Presidente da República. A sociedade tem mecanismos para se defender e tem de os exercitar.  

  7. # Anonymous Anónimo

    Ui, ui, já percebi. apanhaste o vírus dos pedagogos dos anos 70, 80. olha que eu já o apanhei quando tinha vinte e poucos anos. mas livrei-me dele. conheço bem essas palavras bonitas: a integração, a articulação, a interdisciplinaridade. quando escrevi o meu relatório de estágio estava lá tudo e levei logo 17 valores.
    estiveram 3 horas a discutir como é que vão combater o insucesso no 10.º ano? deixa-me ver, aposto que não chegaram a conclusão nenhuma. ou então que resolveram tomar umas medidas absolutamente inúteis que vão levar a lado nenhum. ou então ainda que vão baixar os níveis de exigência. (já agora relembro que estava a falar do ensino básico. o secundário não tem o mesmo problema porque os alunos estão lá porque querem e portanto têm outra atitude)
    Agora mais a sério, estes tópicos que tu apresentas são feitos para não se fazer nada. há pelo menos 30 anos que se falam neles. mas por que raio se há-de perder tanto tempo com a coordenação dos programas disciplinares se os alunos têm cada vez piores níveis de aprendizagem? o que é importante é promover um ensino de exigência, de erudição e de disciplina. tu queres saber por que razão os alunos de 10.º ano têm tanto insucesso. porque durante nove anos puderam passar sem grandes dificuldades. obviamente, quando chegam ao ensino secundário em que o nível de exigência começa a ser outro não têm bases nenhumas.
    estas coisas parecem básicas e são. mas têm de ser ditas.
    quanto à indisciplina e para acabar. o problema está, mesmo, na questão da autoridade. no meu tempo, os alunos podiam ser indisciplinados, mas a autoridade funcionava mais cedo ou mais tarde, porque os professores tinham instrumentos para a utilizar. hoje, se os alunos quiserem portar-se mal não há nada a fazer. simplesmente não há nada a fazer. são eles que decidem. é claro que há professores que são mais hábeis do que outros, e conseguem lidar melhor com as situações de indisciplina, mas a verdade é que não pode fazer a disciplina depender disso.  

  8. # Blogger Alex

    Os "pedagogos dos anos 70 e 80" não tinham virtudes? Eram só defeitos? Olha que eu fiz a minha escolaridade entre 78 e 88 e não me safei assim tão mal.
    Já nos estamos a desviar do assunto do post, mas para teu entretenimento, e para poderes escarnecer mais um pouco do nosso trabalho, até te posso indicar as medidas que eu sugeri e que foram aprovadas:
    - os departamentos que englobam as disciplinas de Matemática, Física e Química, Inglês e Português vão designar, até à próxima semana, uma comissão de três professores para consultar os programas do 3º ciclo, identificar as competências básicas essenciais para a frequência do 10º ano e prepararem um conjunto de questões a incluir num grande teste diagnóstico que vai ser ministrado a todos os alunos do 10º ano que ingressarem em 2008/09 na primeira semana de aulas;
    - já foi criada uma equipa (da qual faço parte), que vai receber os testes (que serão de múltipla escolha, com excepção de uma composição), colocar imediatamente as respostas dos alunos numa aplicação que vai fazer algum tratamento estatístico dos dados, devolvendo-os logo de seguida aos professores. Assim, espera-se que os professores tenham algum ideia, logo à partida, das maiores dificuldades da turma e dos alunos, individualmente;
    - os professores do 10º ano serão obrigados a marcar as horas de apoio educativo em contra-turno com a turma. Como a maior parte das turmas do 10º ano tem aulas de manhã, os professores são obrigados a dar apoio à tarde, num período em que a turma não tenha aulas, para os alunos que queiram frequentar o possam fazer;
    - as fichas de apoio educativo para o 10º ano serão disponibilizadas na plataforma Moodle da escola, para que os alunos tenham acesso a partir de casa. Estas fichas já foram criadas no ano lectivo passado e cobrem todas as unidades dos programas das disciplinas que já citei e mais algumas (Economia, Francês, etc.).
    Tudo bem. São medidas inúteis que não vão levar a lado nenhum. Na tua opinião a escola portuguesa é uma catástrofe e não há nada a fazer. Porreiro. Mas pelo menos dás-me o benefício da dúvida e deixas-me tentar?  

  9. # Blogger Alex

    Ah, passou-me ao lado.
    "relembro que estava a falar do ensino básico. o secundário não tem o mesmo problema porque os alunos estão lá porque querem e portanto têm outra atitude".
    Estás completamente ao lado. Noutro planeta. Deves estar a referir o secundário de há 20 anos, quando lá estavas.  

  10. # Anonymous Anónimo

    1.º Quando referi que o secundário não tem o mesmo problema estava a falar da disciplina, é bom não esquecer. E já agora digo-te uma coisa. Quando falo com professores do básico o discurso é um, quando falo com professores secundários o discurso é completamente outro. Tenho inúmeros exemplos. Porque será? Tenho até uma irmã que já não dava aulas no básico há décadas e que ficou completamente à nora quando no ano passado teve de apanhar turmas do 3.º ciclo.
    2.º Sabes porque é que até te safaste bem na tua escolaridade? Porque as ideias dos pedagogos dos anos 70 e 80 ainda mal tinha sido postas em prática. Elas só começaram, muito timidamente, com a lei de base do ensino básico (que julgo que é de 84).
    3.º Tens razão em relação a reunião. Mas mais uma vez digo: eu estou a falar do básico; é lá que estão os principais problemas. Mesmo os problemas que vocês tentam resolver no secundário têm que ver com as graves deficiências do básico.
    4. Vou repetir isto exaustivamente porque tu parece que não entendes. A escola pública não é uma catástrofe. O ensino básico está perto de o ser.  

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