O veto ao projecto-lei da paridade foi gerido pelo grupo parlamentar do PS com pinças, e percebe-se bem porque. O supra-partidário ainda não acabou o período de lua-de-mel com quem o elegeu, e por outro lado, o governo está-se a ver um bocado aflito com as queixas dos funcionários públicos, empregados, patrões, e de resto, quase todo o país. Tempos difíceis.
E também eu tenho uma opinião dúbia acerca da paridade entre sexos nas listas eleitorias. Se por um lado vejo como essencial uma participação mais equalitária de mulheres, por outro não sei se um decreto é a forma correcta de a obter.
Aquilo que me soa a ridículo no veto é a razão expressa pelo PR. Segundo o homem do bolo-rei, a rejeição das listas candidatas é "excessiva e despropositada". Responda quem souber então o que é que se poderia fazer se uma lista que não cumprisse a lei desse entrada na Comissão Nacional de Eleições. Eu posso dar algumas sugestões:
- um tau-tau em cada mão de cada candidato;
- a CNE teria uma lista de reserva com mulheres, pretos, ciganos, emigrantes, deficientes, etc. Sempre que uma lista não cumprisse as quotas, recorriam às reservas (por sorteio ou ordem de entrada);
- colocar a Cavaca em todas as listas, tantas vezes quantas fossem precisas até cumprir a quota.
Mas, se os deputados, o governo e a comunicação social acha bem quem sou eu para estar a meter nojo.
4 Comentários a “Paridade, não!”
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Para esclarecimento...
Mensagem do Presidente da República à Assembleia da República, a propósito do Decreto nº 52/X (Lei da Paridade)
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
Excelência
I. Recebi para ser promulgado sob a forma de lei orgânica o Decreto nº 52/X da Assembleia da República, designado por “Lei da Paridade”, o qual “Estabelece que as listas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as Autarquias Locais são compostas de modo a assegurar a representação mínima de 33% de cada um dos sexos”.
Trata-se de um diploma estruturante do funcionamento da democracia representativa e relevante para o exercício de direitos e liberdades políticas fundamentais, reclamando, por essa mesma razão, um escrutínio particularmente atento por parte do Presidente da República.
Considero um pilar fundamental da qualidade da democracia portuguesa o aumento da participação das mulheres na vida política.
Como tal, à luz das disposições do artigo 109º da Constituição, entendo constituir uma obrigação do legislador, tanto a remoção de discriminações negativas em razão do sexo no acesso a cargos políticos, como, também, a promoção da igualdade no exercício de direitos políticos.
Contudo, a legitimidade dos valores a proteger e dos fins a alcançar através de medidas positivas que promovam a paridade não justifica a utilização de todo o tipo de meios para os atingir. Isto, sobretudo, se os mesmos meios comprimirem desproporcionadamente e sem fundamento material razoável, outros valores de relevo político e constitucional que mereçam ser acautelados.
Tal é, claramente, o caso do artigo 3º da “lei da Paridade”.
II. A objecção de fundo que coloco ao mérito do diploma centra-se, precisamente, na circunstância de o seu artigo 3º, ao prever a possibilidade de rejeição das listas de candidaturas desconformes com o respectivo preceituado, se afigurar como um regime sancionador excessivo e desproporcionado e, como tal, desadequado para preencher os fins prosseguidos pela mesma legislação.
O carácter excessivo e desproporcionado do meio consagrado deriva da circunstância de o mesmo:
- Constituir uma severa restrição à liberdade e ao pluralismo de opções que inerem á democracia representativa, na medida em que pode impedir que certos partidos ou listas de candidaturas eleitorais, que não aceitem ou que não possam cumprir com os rígidos critérios do diploma, sejam impedidos de concorrer a eleições;
- Interferir, de forma exorbitante, na liberdade e identidade ideológica de cada partido relativamente à matéria da paridade e limitar a sua autodeterminação política interna em poder organizar as listas de candidatos de acordo com a vontade dos respectivos órgãos eleitos democraticamente;
- Restringir, sem fundamento razoável, a liberdade de escolha do eleitorado relativamente às listas de candidatos, mediante uma inclusão artificial e forçada em lugares elegíveis de candidaturas desconhecidas ou não desejadas, de um ou de outro sexo;
- Dificultar, desnecessariamente, a constituição de listas nas eleições locais onde, em certas áreas menos povoadas do interior e com elevado índice de envelhecimento (nas quais não seja aplicável a excepção do nº 4 do artº 2º do decreto), se torna problemático recrutar candidatos dentro dos estritos limites da representação de género impostos pelo diploma;
- Petrificar um regime limitativo da liberdade política já que, sendo a fixação de índices de representação em razão do sexo uma medida naturalmente transitória destinada a inverter situações de sub-representação de género, se verifica que no diploma inexiste qualquer cláusula com esse carácter transitório, ficando um regime restritivo que por natureza deveria ser temporário envolvido na rigidez própria das leis orgânicas;
- Forçar a passagem súbita de um sistema que não prevê índices mínimos de representação de género na apresentação de candidaturas eleitorais, como o actual, para um dos regimes mais dirigistas da Europa, o qual vai ao ponto de admitir a proibição da apresentação de partidos ou de listas de candidaturas a eleições.
Para além das razões expostas, considero, ainda, que carece de sentido, em termos de necessidade, a opção de criar uma das disciplinas sancionatórias mais rigorosas em matéria de representação de género de entre os Estados da União Europeia, sem que se tenha, previamente, intentado esgotar outras soluções adoptadas por vários desses Estados que correspondem às melhores práticas e que se revelam mais afeiçoadas à liberdade política.
III. A dignificação dos direitos políticos das mulheres constitui uma prioridade constitucional que deve ser atingida através de meios adequados, progressivos e proporcionados e não por mecanismos sancionatórios e proibicionistas que concedam às mulheres que assim acedam a cargos públicos um inadmissível estatuto de menoridade.
Do mesmo modo, importa fazer primar os valores fundamentais da liberdade e do pluralismo na selecção, apresentação e votação dos candidatos a eleições políticas, sobre uma opção penalizadora destinada a alcançar, mediante sacrifícios e restrições excessivas, uma paridade de género que poderia ser atingida por meios mais razoáveis.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 134º da Constituição da República e nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 136º da CRP, decidi não promulgar como lei orgânica o Decreto nº 52/X da Assembleia da República, solicitando, pelos fundamentos apresentados, uma nova apreciação do diploma.
Com elevada consideração.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Aníbal Cavaco Silva
Um bocadinho atrasado, mas cá vai.
Lê-se na mensagem: "A objecção de fundo que coloco ao mérito do diploma centra-se, precisamente, na circunstância de o seu artigo 3º, ao prever a possibilidade de rejeição das listas de candidaturas desconformes com o respectivo preceituado, se afigurar como um regime sancionador excessivo e desproporcionado e, como tal, desadequado para preencher os fins prosseguidos pela mesma legislação."
Assim, o meu comentário faz todo o sentido. Se uma lista que não está conforme a legislação não for rejeitada, o que é que se faz com ela? Aceita-se à consignação? Este veto, enquanto baseado neste argumento, é despropositado.
É óbvio que isto é um veto político, firmado sobre os votos contra do PSD e do PP, que no Parlamnto não vingaram, mas que encontraram eco no PR.
Alex,
As sanções, ainda dentro de um quadro legislativo, poderiam passar, por exemplo, pelo corte substancial dos apoios públicos aos partidos não cumpridores das chamadas quotas de género. E quando falo em corte falo em "ir mesmo ao bolso dos partidos".
A questão política está em o PR entender que a questão da paridade não deve passar por uma solução legislativa mas pela implementação de outro tipo de práticas.
Podes concordar ou não com os argumentos. O que não podes é titular de rídiculo aquilo com que não concordas. E não te esqueças que o veto foi firmado também sob o voto do Partido Comunista e dos Verdes.
Eu não concordo com a sanção pois põe em causa a substância do nosso regime democrático: a liberdade eleitoral dos partidos formarem as suas listas sem ingerências externas. Nunca me farão aceitar a figura tutelar do Estado em matérias como esta.
No entanto, também reconheco que o PR quis deixar uma saída ao Governo elegendo esse motivo como o principal para o seu veto.
Neste momento, o país não precisa de conflitos abertos entre o PR e o Governo, nem de oposição presidêncial ao Governo (como aconteceu no passado, lembras-te?). Muito menos por causa de uma questão como esta! Não concordas?
Um abraço,
Leandro.
Viva,
Começando pelo fim, concordo. Aqui não se deveria pôr sequer a questão o conflito. Se o veto é um direito do PR, ele deve exercê-lo sem pôr em causa a estabilidade.
Não concordo que a lei da paridade seja uma ingerência na organização partidária.
E eu posso dizer que a razão invocada é ridícula sem pôr em causa a pessoa. E mantenho que me parece descabida.
E, já agora, se me permites, repara que enquanto o teu argumento para não aceitares a paridade é lógica, Cavaco Silva "aceita-a". Não concorda é com a sanção. Isto, no meu entender, não faz sentido.
Por último, apraz-me dizer que os teus argumentos são, por norma, bem melhores que os do PR ou do líder do teu partido. Continua a frequentar o blog.
Um abraço.