Ia começar o post por explicar o que é um drone de guitarra. Mas utilizo um exemplo: imaginem a introdução de "Satisfaction", aquela que faz tã-tã-tãrãnã-tãrãnãnãnã-tã-tã. Agora pensem neste riff dez vezes mais lento e repetido 200 vezes. É um drone.
Estiveram ontem na Casa da Música dois agrupamentos que apostam tudo no drone. Primeiro os Earth, já entradotes, que o fazem de forma muito pura, com duas guitarras a jogar contra uma bateria muito esparsa. São uns Black Sabbath em super slow motion, e se não tivessem exagerado na duração dos temas, seriam agradáveis. Mas abriram o apetite.
No entanto, nada poderia humanamente preparar-nos para os Sunn0))). Considerem o que é uma banda rock sem baterista, a tocar uma peça de 75 minutos sem melodia. Nos primeiros cinco minutos da execução era fisicamente impressionante estar de pé, já que o corpo todo vibrava literalmente com a intensidade e a profundidade do som que as colunas debitavam. O som dos Sunn0))) em concerto não se ouve. Sente-se com o corpo inteiro.
Construída sobre um mantra / drone de 3 acordes, a peça desenrolou-se durante 20 minutos até à entrada do vocalista, vociferador durante quase uma hora de palavras indecifráveis, e por vezes dificilmente distintas da massa sonora. As guitarras construíram uma muralha quase inexpugnável, que dificilmente conseguíamos escalar. Uns tentaram contorná-la, com maior ou menor sucesso. Outros desistiram a meio de tanto lhe dar com a cabeça e bateram em retirada. Assim se explica que cerca de um quarto da sala tenha abandonado o concerto antes do fim, sem presenciar uma apoteose de noise, mística e ao mesmo tempo ensurdecedora.
O drone supõe-se hipnótico, quando bem sucedido. O concerto assim foi: hipnótico. As noções de tempo e de espaço desapareceram-me por volta dos quinze minutos. No final, só o drone, qual frase mágica, persistia-me nos ouvidos. E ainda hoje, ao saber-me seguro e em casa, os Sunn0))) prosseguem em concerto nos meus tímpanos.